sexta-feira, 25 de novembro de 2016

Terra I

Ela me contou que em Morretes
as borboletas voam rente ao chão.

Você me disse que espera,
com o fim de Abril,
o frio.

Foi assim que eu soube
que as coisas não tem explicação.

O que existe,
o que morreu,
o que é,
nada precisa de explicação.

O verbo mente, a palavra trai
e o rosto é enganoso.

Mas o teu nome,
havia ainda de ser descoberto.

E sob o calor de Abril,
que mata impiedosamente
as borboletas em Morretes,
eu o descobri e o deixei partir.

Terra II

Eu nada sei do Sertão,
da flor seca no chão rachado.

Nasci entre pedra e aço,
mas tenho em mim a praia do Flamengo,
as calçadas do Palácio do Catete
e a paixão das areias de Copacabana.

O sol continua a atravessar caminhos,
o vento corta o rosto da rua,
já esqueci o que disseram os poetas.

Eu sou o Rio inteiro
e casa abandonada,

ainda não voltei de ti.

sábado, 19 de novembro de 2016

O violão

Deve-se saber, antes de optar por esse risco, que o interminável ensaio e experimentação de desenvolver-se em um instrumento musical é a escolha de uma visitação continua à presença de sua própria insuficiência. A música sempre será mais. Ela é nascida dos ecos da memória, imperecível. Sorte ou não, enquanto o veículo apodrece, aceitar essa servidão é o único caminho para um dia poder ascender à glória possível diante da deterioração da carne.

Ninguém insulta o silêncio impunemente.    

sexta-feira, 11 de novembro de 2016

Terça-feira sem canções de amor

Terça-feira sem canções de amor,
apenas a pedra,
seu centro antipoético,
a estéril pedra, mãe da guerra
e de altares longínquos.

O lugar que existe fora de mim,
o caminho do poeta,
o coração do rio,
a ruína dos reis,
o ímovel obstáculo dos escravos.

A lança do Homem, que transpassa
e mata em mim aquilo que não sou.

A voz de Deus a nos dizer:
não.