Ela leu um poema pra mim.
Ela leu um poema para mim
e me condenou ao passado.
Seguro agora com os dedos
e contra o peito
teu peso, tua voz, teu olhar que me traça
como quem tem para si
uma foto antiga, o preto e o branco.
Ela leu um poema para mim
e agora sou um estrangeiro.
Os cômodos da sala rejeitam o meu corpo,
toco a andar na rua, a polícia me para - querem ver meus documentos,
o meu irmão não me ama mais.
Ela leu um poema para mim
e o tempo dobrou a palavra oboé;
ligo aos amigos, lhes suplico;
diz-me devagar: “o-bo-é”.
Ela leu um poema para mim,
sonho africano de tambor e sangue.
Te espero taciturno e sem apetite,
enquanto uma poeta mineira
alcança a caneta
para escrever sobre o medo.